Por que será que a salsa, um ritmo resultante de tantas misturas, tantas influências diferentes, tanta miscigenação, cuja própria identidade é difícil definir – até o local do seu nascimento é questionado – se torna tão emblemático e tão representativo da cultura e da identidade latinas? Talvez a resposta esteja exatamente na própria pergunta: porque a história e processo de formação cultural da América Latina, seus povos, suas sociedades e seus indivíduos sejam exatamente isso.

Essa pluralidade, essa reunião singular de tantas características diferentes, esse resultado tão intenso quanto surpreendente da mistura de ingredientes tão diversos, essa condição de não ser especificamente nada e ser tanta coisa ao mesmo tempo, está no germe que criou esse ritmo tão rico (mais do que isso, essa cultura de música, dança e comportamento) e está também no sangue que corre nas veias de cada indivíduo que ajudou a criar a história desse continente, único em toda a sua riqueza.

E começo minha coluna e minha participação na Dança em Pauta com uma afirmação que, por mais óbvia que possa parecer, ainda assusta e surpreende muitos de nós brasileiros:

Somos latinos também!

Isso mesmo. Por mais que sonhemos em conhecer Nova York, fazer compras em Miami, passar a lua de mel em Paris, que moremos em tantos condomínios com nomes pomposos em inglês, que hajam por aí tantos filhos chamados “Jeniffers” e “Washingtons”, a realidade é que somos tão latinos como nossos “hermanos” do Chile, Paraguai, Colômbia, Venezuela, Cuba e de todos os outros países que compõem o vasto território da América Latina.

E devemos dar graças a isso! Somos brancos, somos negros, somos índios, somos europeus, africanos, asiáticos, somos tropicais, coloridos. Temos o samba, o tango, o forró, o bolero, o chachacha, o merengue e, claro, a salsa, com toda a sua pluralidade, força, vibração e incrível poder, só para citar os ritmos mais populares. Somos algo que ninguém mais poderia ser.

Falta ainda a nós, brasileiros, o reconhecimento dessa condição, uma maior aproximação e aceitação dessa identidade e do orgulho que ela representa. Minha vivência esses anos todos como professor, dançarino, coreógrafo, músico, pesquisador e produtor, mostra que vale muito à pena.

(Ricardo Garcia – originalmente publicado no portal Dança em Pauta )

 

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